Pelo 5.º mês consecutivo, este ano, as vendas de automóveis em Portugal foram inferiores aos valores homólogos do ano anterior. Apesar de no mês de Maio ter existido um ligeiro aumento das vendas face a Abril, da ordem das 2200 unidades, os valores continuam a preocupar o sector e irão, certamente, implicar o fecho de mais concessionários. Mas o reflexo desta crise que se abate sobre todo o sector automóvel promete não ficar por aqui: não só não se vende como não se faz a manutenção periódica, deixa-se de ir à inspecção periódica e poupa-se em tudo, mesmo que, por causa de isso, se coloque em risco a segurança ou o ambiente.
Nem mesmo os piores cenários traçados pelos importadores nacionais mais pessimistas apontavam para uma queda global, decorridos os primeiros cinco meses do ano, de 43 por cento das vendas de automóveis ligeiros em Portugal.
Como se referiu no início, Maio trouxe uma ligeira desaceleração nessa descida, explicada, segundo a ACAP – Associação do Comércio Automóvel em Portugal –, pelo facto de se tratar de um período geralmente escolhido pelas empresas de aluguer de viaturas para procederem à renovação das suas frotas.
Poderá ainda existir uma outra razão: algumas marcas e concessionários esgotaram os stocks de veículos registados no ano anterior, modelos que beneficiaram de regimes fiscais mais favoráveis.
O luxo vende mais
Face ao rumo actual da economia portuguesa não existem perspectivas de melhorar este cenário negro. Nuvens escuras acumulam-se no horizonte e muitos concessionários vão sobrevivendo graças ao comércio de viaturas usadas, sejam elas provenientes de retomas ou resultado do incumprimento dos contractos de venda.
Uma realidade diferente parece estar a ser vivida por marcas consideradas “de luxo”: BMW, Audi e Mercedes estão entre as oito mais vendidas em Portugal, mas é de realçar que qualquer destes construtores dispõe de uma gama mais generalista do que ocorria há alguns anos atrás.
Razões mais do que conhecidas
Os motivos para isto estar a acontecer são por demais conhecidos: diminuição do poder de compra das famílias – realce para os funcionários públicos que perderam os subsídios que geralmente utilizavam para a “entrada” -, dificuldade da concessão de crédito a particulares e empresas e até uma retracção própria do impulso de aquisição, algo que habitualmente acontece nas alturas de incerteza quanto ao futuro económico.
Isto apesar de alguns modelos estarem, efectivamente, mais baratos do que há um, dois ou mais anos. Desesperadas campanhas de marketing dos importadores propõem vantagens comerciais directas, em equipamento ou em combustível de milhares de euros na aquisição de determinados modelos.
Nem mesmo assim. É que as financeiras, a braços com processos judiciais por incumprimento de contractos, às vezes com os carros imobilizados e a desvalorizarem enquanto se arrastam os processos de falências, estão mais cautelosas na concessão de novos créditos. E este está também mais caro, com taxas de juro habitualmente com dois dígitos.
Consequências para o futuro
Uma questão mais grave se levanta, no imediato: a sobrevivência das empresas. Apesar de alguns concessionários terem-se transformado em representantes multimarca ou terem alargado a área de negócio a outros serviços, apostando, por exemplo, na venda de usados, todos os dias fecham empresas e cresce o número de desempregados no sector.
O Estado arrecada, por isso, menos receitas provenientes dos impostos directos da venda de veículos novos e a redução do número de carros a circular implica também uma diminuição da quantidade de combustível vendida.
Logicamente isso também produz reflexos nos impostos.
A médio e a longo prazo podem descortinar-se outras preocupações: aumento da poluição gerada pelo aumento da circulação de automóveis com oito ou mais anos, pela mesma razão e não só, crescimento da sinistralidade. É que, com o acréscimo de viaturas antigas a circular, aumenta também o número das que deixam de reunir condições de segurança.
Quem paga é o ambiente!
Por mais optimista que se queira estar, quem todos os dias contacta directamente com o sector, percebe que Portugal se encaminha para um cenário terceiro-mundista.
Um grande concessionário da margem sul confidenciava-me, recentemente, que cada vez são menos os carros que recorrem às oficinas das marcas que representa, apesar dos preços tabelados de alguns serviços estarem próximos dos praticados em oficinas multimarca. Só que, segundo esse concessionário, alguns dos seus colaboradores oficinais estavam a encaminhar os clientes para os seus próprios negócios paralelos de reparação e manutenção, sem qualquer controlo fiscal, laboral, higiénico ou ambiental.
Esta é, afinal, uma realidade conhecida de todos e facilmente explicável: preços mais baixos (até porque livres de impostos) dos serviços e peças mais baratas (por não serem “de marca”, ou porque, pura e simplesmente, se trata de material usado ou desviadas do armazém).
Tudo isto exercido sem os seguros obrigatórios por lei, controlo médico ou laboral, factores que encarecem o factor trabalho de qualquer empresa.
Por outro lado, as exigências ambientais com a recolha de resíduos ou a reciclagem são igualmente menores - ou mesmo existentes - nos chamados biscateiros. Este é outro aspecto a que são obrigadas as oficinas licenciadas, para o qual são canalizados recursos económicos.
Inspecções pouco rigorosas e o “faça-você-mesmo”
Contudo, algo de mais preocupante parece estar a passar-se com as inspecções periódicas obrigatórias: não só estão a ir cada vez menos carros às inspecções – continuando, contudo, a circular -, como aumenta o número de funcionários que se propõem a “facilitar” a vistoria do veículo em troca de determinado montante.
Importa ainda alertar para uma outra realidade: face à crise e aos preços praticados por alguns hipermercados (ainda há bem pouco tempo foi possível, num deles, comprar 5 litros de óleo Galp 10W40 por menos de 12 euros…), alguns proprietários estão a realizar, eles próprios, algumas tarefas de manutenção. Que destino terá sido dado ao óleo usado e respectivo filtro e em que condições a operação terá sido realizada?
Para não falar nos pneus com a borracha velha e ressequida, comprados usados e supostamente ainda com bom piso. Mas isso é outra história.
Como era de prever no actual contexto de crise económica, o sector automóvel começou a sofrer fortemente com as medidas de contenção a que muitos particulares e empresas foram sujeitos nos últimos meses. Em Janeiro foram vendidos apenas 9065 automóveis ligeiros de passageiros e comerciais ligeiros, o que representa uma forte redução de 42,2% face às vendas registadas em igual período do ano passado. É o valor mais baixo de venda de veículos em Portugal dos últimos 25 anos! O sector entrou em “estado de alerta” e, para sobreviver, necessita urgentemente de medidas de incentivo ao consumo.
Janeiro é, por tradição, um mês ingrato para as vendas automóveis em Portugal. Isto sucede porque o final de cada ano é tipicamente uma altura forte das vendas, devido ao facto de muitas marcas criarem fortes apelos ao consumo ou matriculam viaturas não vendidas para “fechar o ano” com quota de mercado. Os próprios consumidores, aproveitando o abono extra ou evitando os tradicionais agravamentos fiscais a cada novo ano que desponta, escolhem a altura para trocar de carro. E até as empresas, pelos mesmos motivos fiscais, decidem a renovação das suas frotas nos últimos meses do ano.
Por isso, ao analisar as vendas nos últimos anos, reparamos facilmente em padrões: picos em Março (renovação de frotas devido ao fecho do ano fiscal de algumas empresas), Junho, Novembro e Dezembro, umas vezes ainda por causa da renovação de frotas, outras porque coincidem com a altura em que muitos consumidores particulares recebem os tradicionais subsídios de férias e de Natal.
Uma realidade que, como se sabe, tende a mudar. Agravada ainda pelo elevado número de funcionários públicos em Portugal.
2011, ano negro para o sector
Olhando para os números de 2011, e comparativamente às vendas do ano anterior, verifica-se facilmente que elas foram sempre claramente inferiores. E se o cenário em meados do ano já era complicado, mais se agravou no final do ano apesar de uma ligeira mas insuficiente recuperação das vendas.
O ano de 2011 fechou com cerca de 188 mil viaturas ligeiras vendidas em Portugal (passageiros mais comerciais), o que representou uma queda de 30 por cento face às 269 mil comercializadas em 2010.
Apesar do ano de 2010 ter tido razões de incentivo à compra: a previsão de um claro agravamento fiscal e o fim do incentivo governamental ao abate.
Peugeot lideraNeste contexto altamente desfavorável, a Peugeot foi a marca que mais vendeu em Portugal, com 838 veículos de passageiros e comerciais ligeiros comercializados. E apesar das quebras alinharem com as médias gerais do sector (- 42,6% face ao período homólogo), este resultado representou uma quota de mercado de mais de nove por cento entre as 35 marcas analisadas.
Olhando para este mesmo quadro verifica-se o terceiro lugar da Citroën, o que é um claro indício da boa aceitação que os produtos do grupo francês PSA está a ter. A também francesa Renault é no “10 mais” a marca mais castigada, ao descer de 1759 unidades vendidas em Janeiro de 2011 para 676 registadas no primeiro mês deste ano. Esse resultado coloca em quarto lugar das vendas a marca que liderou o mercado português em 2011 (ver AQUI).
Mas no “Top 10” das marcas que mais venderam em Portugal em Janeiro de 2012 é possível encontrar ainda outros factores de interesse: o ainda assim interessante sétimo lugar da Toyota e as boas vendas de duas marcas de prestígio: Mercedes e BMW que encerram a contagem das 10 marcas mais vendidas.
Já ao longo da restante lista é possível encontrar outros factores de interesse, relevando, contudo, apenas o facto de em Janeiro deste ano se terem vendido em Portugal 18 Jaguar, 16 Porsche e… 2 Ferrari.
Vendas europeias também descemO fenómeno da redução das vendas de veículos novos não é um problema português. No cômputo geral, a Europa registou em 2011 uma diminuição ligeira inferior a 2 por cento, mas em alguns mercados, como o espanhol, essa contracção foi superior a 17 por cento. Itália teve uma redução acima dos 10 por cento, Inglaterra de 4,4 por cento e apenas a Alemanha registou uma subida de 8,8 por cento. Foi naturalmente o mercado que absorveu maior número de carros novos (3.173.634 veículos ligeiros de passageiros vendidos), seguido por França (2.251.669 unidades) e do Reino Unido com 2.030.846 viaturas comercializadas.
Como no início se afirmou, ao longo de 2011 foram vendidos em Portugal 188.321 veículos ligeiros de passageiros ou comerciais.
Tabela comparativa das viaturas vendidas em Portugal em Janeiro 2012:
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